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Max e Iggor Cavalera emocionam em apresentação saudosista no Rio de Janeiro

Max e Iggor Cavalera emocionam em apresentação saudosista no Rio de Janeiro

9 de agosto de 2022


Na última sexta-feira, 5, enquanto o Soulfly lançava seu mais novo álbum, Totem, o workaholic Max Cavalera voltava ao Rio de Janeiro, juntamente com seu irmão Iggor para a celebração aos 25 anos do icônico álbum “Roots”. O desembarque dos irmãos coincidiu com a chegada de uma frente fria que deixou a cidade maravilhosa com um clima mais ameno, lembrando bem de longe que estamos no inverno. E cá estávamos nós a acompanhar tudo que aconteceu no Sacadura 154.

Chegamos bem cedo ao local, que abriu por volta das 20h. A entrada foi bem tranquila, haviam algumas pessoas no entorno, mas a impressão era de que a casa não lotaria. Um ledo engano. Particularmente a minha expectativa era enorme, pois meu primeiro show grande foi lá em 1996 quando o Sepultura se apresentou com a formação clássica, naquela que ficou conhecida como a última aparição da banda com Max no vocal. Embora a dupla já tenha desembarcado outras vezes em terras brasileiras, desta vez era diferente. E especial.

As 20:45, o The Troops of Doom fazia a sua estreia nos palcos cariocas, destilando seu Thrash/ Death altamente violento e rápido. O som estava absurdamente fantástico. Em um set de 45 minutos e dez músicas depois, eles mostraram o porque são a banda do momento. Jairo Guedz segue um monstro da guitarra, seu parceiro das seis cordas, Marcelo Vasco não fica atrás, mas o vocalista/ baixista Alex Kafer com seu carisma, ajudando a levantar o público carioca como ele e o baterista Alexandre Oliveira, que é um monstro atrás do seu kit, quebrando tudo, foram os grandes destaques desta apresentação, que, obviamente, incluiu os covers para “Bestial Devastation”, “Morbid Visions” e claro, “Troops of Doom”, que Jairo tocou com o Sepultura lá nos primórdios. O som estava perfeito e assim eles deixaram os presentes bem aquecidos para a atração principal. Ao final, uma certeza: não era uma disputa, mas os irmãos Cavaleras estavam perdendo o jogo de lavada e teriam de suar muito a camisa para ao menos igualar a performance deste quarteto.

Pausa para os roadies arrumarem as coisas no palco e fazer os últimos ajustes e enquanto isso eu pensava em como Max e Iggor iriam ter que “rebolar” para superar a apresentação da banda de abertura. Foi questão de me ausentar por alguns minutos da pista e ao voltar, a mesma já estava tomada por um mar de gente, todos ali saudosistas como este redator que vos escreve e sedentos para ver o verdadeiro Sepultura. Foi aí que eu tive a certeza de que eles iriam conquistar o público com o pé nas costas.

Pontualmente às 22h, os irmãos entraram no palco e a casa estava cheia como nunca eu havia visto antes. Claro que todos vieram para ver os irmãos e eles subiram já com o público nas mãos e “Roots Bloody Roots” transformou o local em um pandemônio. Eles seguiram a ordem das faixas do disco homenageado pelo menos até “Spit” e praticamente sem intervalo. Depois eles inverteram algumas músicas, mas voltaram a seguir a ordem das faixas até o final. Só não incluíram os bônus que foram lançadas exclusivamente na versão brasileira: “Procreation (of the Wicked)” e “Symphton of the Universe”.

A curiosidade era imensa em ver como se comportaria o guitarrista Dino Cazares, que mandou bem, no seu estilão, com pouca presença de palco, mas competente na reprodução do que a gente conhece no disco. Claro e evidente que ele não é o Andreas Kisser, mas ele tem a mão pesada também. Eles são amigos há anos e participa dos projetos de Max desde o Nailbomb, lá em 1994. O baixista Mike Leon também teve uma atuação que se Paulo Xisto o assistisse, ele, por vergonha, nunca mais pegaria em um baixo no que resta da sua vida. Max estava bem a vontade e feliz tocando, mas a grande estrela deste show sem sombra de dúvidas foi Iggor Cavalera. Com um som estupendo, que realça as suas batidas tribais, ele que não precisa provar mais nada para ninguém, mas ele mostrou que ele é definitivamente o maior baterista que este país já conheceu. Seu solo em “Itsari” foi um momento único e teve seu nome gritado em uníssono pelos presentes. Podem dizer que o cara não gosta mais de metal e blá blá blá, mas o Iggor Cavalera é um monstro sagrado.

Mas o ponto alto foi durante a execução de “Lookaway’. A música que é a mais chatinha do disco, ao vivo ela se destacou pela improvisação de Max. No meio da música, a banda parou de tocar, ele pediu para que todas as luzes da casa fossem apagadas e que todos acendessem as lanternas dos celulares. O lugar ficou completamente claro e aí Max puxou “War Pigs”, que foi cantada por todos nós à capela. Sim, caro leitor, nós, pois este que vos escreve estava lá também a trabalho, mas não poderia ficar inerte a uma cena tão linda. Ato continuo, a banda retornou tocando a parte final de “Territory” e aí a destruição foi completa. Foi assim que eles definitivamente queimaram a língua de quem achava que a banda de abertura iria se destacar mais do que os donos da festa.

Claro que a galera foi ao delírio na hora de “Roots Bloody Roots” e “Ratamahatta”, por exemplo. As músicas foram reproduzidas quase que fielmente ao disco, ganharam em peso. Max já não tem o poderio vocal de outrora, mas compensa com presença de palco. Ele é um dos maiores frontman da cena. Era nítido no semblante dele a sua satisfação, o seu esforço para tocar um disco tão complexo da melhor maneira possível. Em “Endangrered Species”, Max explicou que a letra era dedicada a Chico Xavier.

Após “Dictatorshit”, um breve intervalo e a plateia aproveitou o contexto da letra dessa música para mandar o dublê de presidente da República ir para um lugar bem específico: Iggor retornou e acompanhou no bumbo a melodia da simpática canção e Max afinou… Perdeu a grande oportunidade como um dos maiores vocalistas do Metal de se posicionar e ganhar ainda mais o público. Ele se limitou a dizer que o futuro é indígena, o slogan da turnê dos irmãos. E Iggor para de afirmar ainda mais como “o cara” do show, ao final foi a frente do palco com uma bandeira Antifascista.

A segunda parte do show foi definida por Max como um momento de festa. Mas era uma festa bem ensaiada por sinal, já que o repertório foi tocado em todos os shows da turnê. Rolou “Refuse/Resist”, “Orgasmatron”, a impagável “La Migra”, apresentada por Dino Cazares a pedido do próprio Max após ele brincar com o amigo. Em “Polícia”, que o público cantou até mais do que o próprio Max, teve uma tentativa de solo executada por ele. Jairo “Tormentor” Guedz foi convidado a subir o palco e Max soltou a pérola da noite: ali estava o verdadeiro Sepultura. Ele nem precisava dizer isso, mas errado ele não estava. “Escape to the Void” foi um arregaço, teve também a obrigatória “Refuse/ Resist” e por fim eles tocaram “Roots Bloody Roots” em uma versão meio Punk, meio Death Metal. Escrachada, porém, bem divertida.

Duas horas de show que deixou os saudosistas emocionados. Particularmente eu não contive as lágrimas, pois ali eu vivia um momento especial. Em 1996, o Sepultura tocou na turnê do Roots e, era o último show no Brasil com a formação clássica e o primeiro show grande que eu presenciava. Então não pude negar que passou um filme na minha cabeça ao relembrar da minha adolescência, tendo a trilha sonora da mesma. E o que é melhor, tocada pelos dois que compuseram. Impossível separar a razão da emoção. O Rio de Janeiro aprovou essa noite histórica e o Sacadura 154 vai emergindo como um dos melhores locais do Rio para apresentações. De pensar que “Roots” quase não viu a luz do dia, pois o executivo da Roadrunner definiu o projeto apresentado por Max como “um produto para cometer suicídio comercial”. Nós já estamos esperando o retorno dos irmãos ano que vem para comemorar os 30 anos de “Chaos A D.”.

Setlist The Troops of Doom:
Intro
The Abscence of Light
The Devil’s Tail
Between the Devil
Altar of Delusion
Intro
The Monarch
The Curse
Bestial Devastation
A Queda
Morbid Visions
Dethroned Messiah
Troops of Doom

Setlist Max e Iggor:
Roots Bloody Roots
Attitude
Cut-Throat
Ratamahatta
Breed Appart
Straighthate
Spit
Dusted
Lookaway
Born Stubborn
Itsári
Ambush
Dictatorshit
La Migra
Orgasmatron
Polícia
Troops of Doom
Escape to the Void
Refuse/ Resist
Roots Bloody Roots (versão mais rápida)

Sacadura 154

Data: 05/08/22

Horário: 19h

Rua Sacadura Cabral, 154, Saúde