Em 24 de abril do já longínquo ano de 1998, o Blind Guardian lançava “Nightfall in Middle-Earth”, o sexto e mais emblemático, considerado por muitos fãs como o melhor álbum deste quarteto alemão. E que merecidamente é o assunto a ser abordado em nosso Memory Remains de hoje.
A banda já estava no seu processo de mudança em sua sonoridade, com o excelente “Imaginations From the Other Side”, lançado no ano de 1995 e aqui nós podemos afirmar categoricamente que os caras chegaram o ápice da carreira, criando um álbum com uma sonoridade que beirava a perfeição, combinando peso e melodia na medida certa. E com direito a uma superprodução.
É notório que a banda quase sempre se espelhou nos livros do icônico escritor sul-africamo J.R.R. Tolkien. Para o aniversariante do dia foi escolhido o livro “The Silmarillion”, que é uma obra lançada postumamente pelo filho de Tolkien, Christopher, no ano de 1977. O livro é uma continuação da história contada no livro “The Hobbit” e foi em um primeiro momento rejeitada pela editora. O autor dividiu a história em cinco partes, que foram escritas em momentos distintos e ele gostaria de juntá-las. O filho assumiu tudo após a morte do pai, fazendo as conexões entre cada parte. O livro é tão poderoso que inspirou não só o Blind Guardian: a banda Marillion ganhou este nome por influência do livro; e o Amon Amarth, que em Sindarin, língua falada pelos Elfos, significa Montanha da Perdição.
O álbum tem 22 faixas, mas metade dela é composta de vinhetas, com narrativas de algumas partes da história. Essas vinhetas estão quase sempre entre uma música e outra, salvo raras exceções. Pela complexidade do produto final, é fácil concluir que foi algo bem trabalhoso. Contou com diversos convidados que ajudaram a dar o brilho que o álbum possui. E este foi o primeiro play da banda a não contar mais com Hansi Kursch na função de baixista. Esta função passou a ser gravada e executada nos palcos pelo baixista Oliver Holzwarth. Ele nunca foi membro efetivo da banda, mas a partir deste álbum, ele permaneceu como músico contratado até o ano de 2011.
Assim sendo, os caras viajaram por três estúdios, juntamente com seus diversos convidados: “Twilight Hall Studios” e “Karo Musik Studios”, na Alemanha e “Sweet Silence Studios”, na capital da Dinamarca, Copenhagen, em sessões que perfuraram entre setembro de 1997 e março de 1998. Este último estúdio abrigou também a mixagem. Vamos passear pelas onze músicas que compõem esta obra:
A primeira faixa é “War of Wrath” e uma das onze que funcionam como ponte para alguma música que venha depois. E como o que nos interessa aqui é a música, temos “Into the Storm”, que é um baita som, ainda carregando um pouco das características do disco anterior, mas ao mesmo tempo soando mais moderno e melódico, com inclusão de teclados, algo que era inimaginável por exemplo, quatro anos antes. Mas o resultado ficou excelente.

Hans-Martin Issler
Outra vinheta, “Lammoth” e uma música melódica que vem a seguir: a folk e bonita “Nightfall”, com ótimos arranjos e distanciando o Blind Guardian cada vez mais da sonoridade dos primórdios. Ficou muito boa. Outra vinheta, “The Minstrel”, que é uma pequena faixa com violão acompanhando Hansi Kursch. A faixa a seguir é uma música que se não traz a banda de volta ao Speed Metal de outrora, dá o vigor necessário à uma banda de Heavy Metal: e assim podemos definir a excepcional “The Curse of Feanor”, que é pesada sem deixar o lado melódico que a banda abraçava cada vez mais aqui.
Outra vinheta, “Captured”, antecedendo “Blood Tears”, uma música bem calma maior parte onde temos o violão e o côro que acompanha Hansi Kursch no refrão. Há um flerte com o Speed Metal, mas para a tristeza de muitos, é efêmero. Finalmente duas músicas em sequência sem uma vinheta no meio e assim chega a clássica “Mirror Mirror”, obrigatória nos shows da banda. Ela é relativamente pesada, mas é marcada principalmente pelos duetos das guitarras de André Olbrich e Marcus Siepen, que de vez em quando ameaçam um Speed Metal aqui e acolá. Linda.
“Face the Truth” marca o retorno das vinhetas e logo chega “Noldor (a Dead Winter Reigns)” que é relativamente pesada e carregada de muito clima atmosférico, além da ajuda do côro, novamente marcando presença. Um dos ótimos momentos do play. Quer vinheta? Tome mais uma, “Face the Truth”. Não perca a conta, são onze no total e acabamos de passar da metade, com “Battle of Sudden Flame”. Ao menos essa é cantada e tem um violão e uma flauta acompanhando Hansi Kursch. Interessante. “Time Stand Still (at the Iron Hill)” é o típico Heavy Metal melódico com toques de Folk em alguns momentos. Boa música.
“The Dark Elf” é mais um vinheta que antecede “Thorn”, a minha favorita deste play: ela começa com clima de balada, mas logo fica pesada e densa. A banda toda inspirada nesta música e o destaque vai para a atuação irretocável de Hansi Kursch, que colocou toda a emoção. Ponto alto. Ponto que se mantém nas alturas com a belíssima “The Eldar”, outra que figura no grupo das minhas favoritas. Tendo apenas a companhia de belos arranjos de piano, Hansi Kursch brilha novamente e mostra porque é um dos melhores vocalistas do Heavy Metal Melódico. Tá certo que nas apresentações da banda, é para “The Bard Song” que o público canta em uníssono, mas musicalmente, “The Eldar” é muito mais rica.
“Nom the Wise” é outra vinheta que prepara o ouvinte para a música mais raivosa do disco: a perfeita “When Sorrow Sang”. Guitarras nervosas e um Thomas Stauch insano em uma bateria faz o ouvinte mais saudosista achar que se trata de uma composição dos tempos de “Somewhere Far Beyond”, ainda que o refrão melodico deixe claro que se trata de uma nova estrada a ser trilhada pelo Blind Guardian. Magnífico som.
A seguir, duas vinhetas, a primeira, “Out of the Water”, é um breve Folk onde Hansi tem a companhia dos violões, e na segunda, “The Steadfast” é uma narrativa que logo dá lugar para a última música propriamente dita do play, “A Dark Passage”, que carrega consigo muita melodia e certo peso, viajando pelo Hard N’ Heavy. E “Final Chapter (Thus Ends...)” encerra o álbum com mais uma vinheta, desta feita com o final da história passada em “The Silmarillion”.
Em mais de uma hora de audição, temos um belo álbum, rico musicalmente e que mostrava de uma vez por todas que aquele caminho inicial trilhado pelo Blind Guardian estava sendo deixado para trás. Os caras estavam entrando em outra vibe, mas isso, futuramente traria problemas, pois o baterista Thomas Stauch deixaria a banda por não concordar com tais mudanças no direcionamento. Isso não tira o brilho que este álbum tem e podemos citar sem nenhuma sombra de dúvidas que, ainda que a banda tenha lançado bons discos após este, é “Nightfall in the Middle-Earth” a sua obra-prima.
Enquanto essa pandemia maldita não termina, ou ao menos, tenhamos a população vacinada e minimamente imunizada, só podemos comemorar o aniversário deste baita play, que envelhece cada vez melhor. Dar também os parabéns ao grande Hansi Kursch pela ótima iniciativa em abandonar o projeto Demons & Wizards, o qual ele tinha parceria com o sem cérebro chamado Jon Schaffer. É louvável a sua atitude em se desvencilhar da imagem de quem atenta de maneira covarde à democracia. Os confetes são jogados em dobro na sua direção por conta deste lançamento, do qual, Hansi esteve muito envolvido, ele escreveu todas as letras. Assim sendo, fiquemos na expectativa para que possamos ver a banda em ação novamente, em um futuro breve, lançando discos e nos brindando com suas apresentações, sempre com qualidade ímpar.

Nightfall in Middle-Earth – Blind Guardian
Data de lançamento – 24/04/1998
Gravadora – Virgin
Faixas:
01 – War of Wrath
02 – Into the Storm
03 – Lammoth
04 – Nightfall
05 – The Minstrel
06 – The Curse of Feanor
07 – Captured
08 – Blood Tears
09 – Mirror Mirror
10 – Face the Truth
11 – Noldor (Dead Winter Reigns)
12 – Battle of Sudden Flame
13 – Time Stands Still (at the Iron Hill)
14 – The Dark Elf
15 – Thorn
16 – The Eldar
17 – Nom the Wise
18 – When Sorrow Sang
19 – Out on the Water
20 – The Steadfast
21 – A Dark Passage
22 – Final Chapter (Thus Ends…)
Formação:
Hansi Kursch – vocal
André Olbrich – guitarra
Marcus Siepen – guitarra
Thomas Stauch – bateria
Músico contratado:
Oliver Holzwarth – baixo
Participações especiais:
Mathias Wiesner – teclado
Michael Schürner – piano (The Eldar)
Max Zelzner – flauta
Billy King – vocal
Rolf Khöler – vocal
Thomas Hackmann – vocal
Olaf Senkbeil – vocal
Norman Eshley – vocal (narração)
Douglas Fielding – vocal (narração)