Priscilla Leine, já conhecida pelo projeto O Jardim Sonoro, lançou em agosto de 2025 seu livro de estreia, Em Outra Frequência. A autora propõe um olhar singular sobre os processos de cura e o despertar de propósitos que vão além de uma abordagem de autoajuda guiada pela música, sua escrita oferta um mergulho nas entranhas emocionais, sonoras e espirituais que reativam memórias, revelam feridas e, sobretudo, oferecem caminhos para a resiliência interior e autorealinhamento.
O livro está organizado em capítulos que combinam vivências pessoais da autora, reflexões profundas e uma seleção cuidadosamente montada de músicas — com destaque para bandas como Bring Me The Horizon, Apocalyptica, Angra, Dynazty, Epica, Maestrick e Amaranthe. Cada faixa é usada como bússola emocional: não se trata somente de ouvir para sentir, mas de sentir para se reconstruir. A autora oferece exercícios práticos ao fim de cada capítulo, convidando o leitor a registrar experiências, confrontar momentos de dor ou dúvida, e descobrir resiliência, além de poder acompanhar trilha sonora escolhida para cada exato momento.
A obra reúne ilustrações e design gráfico que atuam em sintonia para criar uma atmosfera sensorial. A capa, assinada por Julie Araújo, e as ilustrações de diversos colaboradores reforçam o cuidado estético do projeto, transformando a leitura em uma experiência que vai além do texto. Pena que o livro esteja disponível apenas em formato digital.
Música, memória e bem-estar: o elo neurocientífico
Como já publicado em artigos anteriores, é possível reconhecer neste livro vários dos conceitos que já abordamos sobre o poder da música como gatilho para MEAMs (Memórias Autobiográficas Evocadas por Música), a importância da plasticidade emocional, os benefícios para o humor — e até para aliviar estresse ou sofrimento interior. Em Outra Frequência não usa linguagem acadêmica pesada, mas, em alusão ao que sabemos pelas neurociências, confirma: quando ouvimos uma música que marcou nossa formação ou viveu conosco em fases decisivas da vida (como adolescência, traumas ou recomeços), ela pode ativar circuitos cerebrais ligados à memória, emoção e recompensa — como o sistema límbico, o hipocampo, córtex pré-frontal — promovendo sensação de conforto, aliviando tensões, ativando um impulso de coragem ou até de reencontro. A autora relata sua história e suas preferências musicais com autenticidade, o que cria uma forte identificação e empatia imediata no leitor, sem se preocupar com rótulos e estereótipos de gêneros musicais. Além de propor uma experiência sensorial (com o links das faixas) e exercícios práticos que estimulam autorreflexão, memória e ação.
Há momentos no livro em que se percebe claramente como o som funciona como agente regulador de humor: uma faixa que ativa lembranças ou é capaz de servir como um empurrão para que você reaja, uma letra que revela o que não se dizia… As músicas selecionadas não são “fundo musical”, mas um material ativo — elas participam da cura. Priscilla Leine propõe, implícita ou explicitamente, que a música pode servir como ponte entre quem fomos, quem somos e quem estamos nos tornando.
Leitura recomendadíssima para quem quer entender melhor o próprio pulso emocional, para quem já sentiu a música salvando o dia, ou para quem está na beira de redescobrir por onde ecoar sua própria voz. Em resumo: Priscilla Leine entrega algo raro e potente — uma obra de cura musical.
“Em Outra Frequência” disponível em e-book: https://l1nk.dev/3Y4Mq