Há um conhecido ditado que diz: “mineiro come quieto”, o que quer dizer que somos discretos, reservados e preferimos fazer as coisas com cautela.
Sempre que encontrava o guitarrista Marcos Resende em algum show, já perguntava: “E o terceiro disco, sai quando?”. Ele ria, disfarçava e só falava que as coisas estavam sendo feitas, uma hora saía. E foi assim, aos poucos, sem alardes, que o Pesta, grupo de stoner/doom de Belo Horizonte, trabalhou nos últimos anos até que em outubro saísse “The Craft Of Pain” (2025), seu terceiro disco.
Logo na primeira audição já dava para perceber que havia mudanças em relação ao anterior e ótimo “Faith Bathed In Blood” (2019): das raízes da banda, formada por medalhões do doom, como Trouble, Candlemass, Pentagram e do obrigatório Black Sabbath, foram adicionados novos instrumentos, como o bongô, maraca, pandeiro, teremim e violoncelo. É o mesmo Pesta pesado e arrastado de antes, mas diferente. Quem vem seguindo a banda desde o começo não vai se assustar, afinal não houve uma guinada musical, mas sim uma entrada bem-sucedida em novos territórios.
Mudança mesmo, visível até, é que o grupo ficou mesmo sendo um quarteto. Desde a saída do guitarrista Daniel Rocha, creditado no encarte como coautor em quatro faixas, coube ao mesmo Marcos se adaptar para superar a ausência do antigo companheiro das seis cordas – e ele tem feito isso bem. Então não temos solos no disco, já que agora é só uma guitarra? Temos sim, alguns bem nervosos, diga-se.
Novamente produzido pelo experiente André Cabelo (vocalista e guitarrista do Chakal) no Estúdio Engenho entre outubro do ano passado e março desse ano, os temas abordados, esses sim continuam os mesmos: crenças doentias, idolatria, perversão, megalomania, luxúria. Outra coisa que não mudou, pelo contrário, aprimorou, são os vocais do Thiago Cruz que está cantando como nunca e agora também aparece tocando violão.
Com faixas mais stoner, como “Masters Of The Craft Of Pain” e “In The Drive´s End” e outras mais inclinadas para o doom, como a percussiva “Marked By Hate”; “The Inquisitor, Pt. I” e “Shadows Of A Desire” que tomam crescentes empolgantes, há ainda duas participações especiais com ótimos resultados: “Mirror Maze”, que tem um refrão envolvente e um baita solo, contou com os vocais do casca grossa Scott “Wino” Weinrich (The Obsessed, ex- Saint Vitus, ex- Spirit Caravan) e “Canto XXI”, linda música acústica, contou com Rodrigo Garcia tocando violoncelo.
“The Craft Of Pain” (2025) está disponível em vinil dourado pela gravadora norte-americana Glory Of Death Records e em CD numa edição bem-acabada pela brasileira Gate Of Doom Records (as letras das músicas em vermelho sobre um fundo preto do encarte que me quebraram, coisas da idade).
Assim como a bruxa escandinava encapuzada que vagava vestida de preto e que trazia em silêncio consigo a peste, o Pesta ressurge. Sorte dos vivos que foram poupados até aqui e que podem ouvir outro excelente disco do grupo. Stay doom!
Formação:
Thiago Cruz: vocais, violão
Anderson Vaca: baixo
Marcos Resende: guitarra, violão, teremim
Flávio Freitas: bateria, percussão
Faixas:
01 Rites Of Enclosure (intro)
02 Masters Of The Craft Of Pain
03 Marked By Hate
04 Mirror Maze feat. Scott “Wino” Weinrich
05 In The Drive´s End
06 Thumbscrew (instrumental)
07 The Inquisitor, Pt. I
08 The Inquisitor, Pt. II
09 Canto XXI feat. Rodrigo Garcia
10 Shadows Of A Desire