É da ótima cena nordestina que vem Facada, um dos maiores nomes do grind/death metal brazuca com mais de vinte anos de estrada, seis discos lançados, quatro splits e muito, muito som bruto.
Desde “Quebrante” (2018) que o grupo não lançava um material só seu, até que em outubro saiu “Truculence” (2025), outra pedrada do quarteto cearense, lançamento da Black Hole Productions.
No embalo do lançamento do disco, convidei o gente boa James (vocais, baixo) para trocar uma ideia sobre o material, falar do baterista novo e dos planos da banda. Confere aí!

HBN – Oi James, tudo certo? Você me enviou uma prévia do disco antes do lançamento e eu de cara saquei ali umas pegadas hardcore/punk em algumas faixas, não que não tivesse isso antes no som do Facada, mas achei “bem na cara” essas passagens. Vocês estavam ouvindo muito hardcore/punk na elaboração do disco ou as músicas que pediram esses trechos?
E aí, Mário, tudo beleza, camarada? Pois é…a gente sempre colocava algumas partes hardcore, mas quisemos evidenciar isso porque antes elas eram tocadas mais rápidas ou eram apenas pontes, mas nesse queríamos mostrar mais. Tudo nesse disco foi na intenção de pegar as partes mais legais e mais extremas de coisas que a gente gosta e que combinava (ou não) com o Facada. Daí teve muita influência do hardcore sueco e americano que quisemos mostrar para contrastar, afinal, o grindcore é composto disso também, mas não poderia ser gratuito.
HBN – Já fazia sete anos que o Facada não lançava um disco só seu, desde “Quebrante” (2018). Tava na hora de quebrar essa escrita! Além da pandemia e da questão de o Ari morar na Alemanha, o que mais atrasou esse lançamento?
Quanto ao Ari, a gente já está bem acostumado porque já faz quase vinte anos que ele mora lá, então essa dinâmica está bem estabelecida e resolvida. Mas nesses sete anos muita coisa aconteceu e afetou diretamente nossas vidas. Assim que o “Quebrante” (2018) saiu, logo depois a pandemia começou e o clima na banda já estava ruim. Fora todo aquele processo da preocupação de se manter vivo durante a pandemia, a gente tinha que cuidar da vida, da rotina e ninguém sabia o quer realmente ia acontecer. A banda foi deixada de lado, mas quando a gente quis retomar, o antigo baterista, que já tinha saído uma vez, já não estava querendo acompanhar o que a gente queria fazer, então ele sugeriu que o Vicente entrasse e logo depois da pandemia começamos a ensaiar com ele, mas só com as músicas que já tínhamos e a partir daí, depois de shows e ensaios, foi que começamos a ter ideias de novas músicas. Eu já tinha feito algumas em casa, só o baixo e fui mostrando aos meninos, dando ideias, mas foi realmente um processo bem lento. Logo após a pandemia tocamos bastante e queríamos tocar as músicas antigas com o Vicente para termos lastro e realmente criar algo que fosse a nossa cara de novo. O disco é curto, mas é um reflexo de várias coisas que vivemos nesse meio tempo, não foi fácil de lidar com um monte de coisa: relacionamentos terminados, conviver e lidar com gente escrota e falsa, perda de parentes, depressão, demorou para a banda reassumir a trajetória e para elaborar isso da pior forma por meio do disco.
HBN – Quando vi o título, achei que o disco seria todo em inglês, mas foi só o nome, já que as letras são em português. Por que escolheram batizar o disco com esse título e em inglês?
Desde sempre a gente pensou que o título do disco fosse a essência do que ele seria e sempre procuramos nomes simples que pudessem dar a ideia do todo. A questão do “Truculence” foi porque era mais difícil gritar TRUCULÊNCIA do que TRUCULENCE. Com “truculência” perderia a força e “truculence” combinou bem mais e não perde o sentido. Acho que nunca vamos fazer um disco em inglês, não seria sincero com a gente mesmo.

HBN – O texto do encarte deixa claro uma insatisfação com diversas situações e comportamentos de algumas pessoas. Essa insatisfação é geral? A relação da banda com a cena tem sido boa ou tem havido atitudes reprováveis de alguns?
Como a cena é feita de gente, então sempre tem algumas pessoas que tem atitude reprovável, mas nós temos uma boa relação com a maioria que vale a pena e isso é realmente gratificante. De toda forma, nossa insatisfação, apesar de ser geral, sempre é ocasionada por um ponto de partida, uma idiotice dita de forma específica ou aleatória, um narcisista que pensa que ninguém percebe o quanto é tóxico ou uma pessoa que age normalmente enquanto mente e trata mal as pessoas ou outra que tenta forjar cancelamentos, mas tudo o que consegue é passar vergonha. Gente que é impossível conviver e ter aquele papo falso inofensivo, mas que causa mal-estar em quem está ouvindo. Às vezes as letras falam de várias dessas pessoas juntas para ter uma unidade entre elas e criar uma raiva real de todas essas atitudes e sempre ter uma lembrança de que não vale a pena ter qualquer tipo de contato se não for uma agressão. Ajuda a mente, o corpo e o tempo na terapia (risos).
HBN – “Truculence” (2025) é o segundo lançamento do Facada esse ano, pouco tempo depois do apocalíptico split “Em Sincronia Com O Fim do Mundo” (2025), lançado em parceria com o ROT. Fala um pouco desse split, como que foi dividir um material com uma banda tão relevante como o ROT.
ROT é aquela banda que todo mundo gosta. São pessoas maravilhosas que tem uma banda foda, é unânime. A gente já gravou cover deles (“Rubbish Country”, lançada no disco de covers “Nenhum Puto De Atitude”, de 2016), um dos primeiros 7 polegadas que comprei na vida foi deles e a gente tem uma relação muito próxima. Quando vieram para Fortaleza ficaram na minha casa, o Diego (baixo do ROT) já organizou tour nossa, então foi algo natural. A gente vive fazendo plano e o do split tinha que ser feito. Era algo que não tinha como ser feito de outro jeito. As ideias, o nome do split, tudo fluiu muito bem e naturalmente. E todo mundo adorou a ideia, apesar da nossa demora, a gente terminou diante das ameaças (risos). Legal que são duas bandas de grindcore, mas que tem suas peculiaridades, são diferentes, mas que se completam. Ficamos muito satisfeitos com o resultado.
HBN – E a entrada do Vicente na bateria, como que foi? Vocês já se conheciam? Apresenta ele aí pra gente.
Quem indicou ele foi o ex-baterista, dizendo que seria a única pessoa que poderia tocar nossas músicas e nisso ele acertou. Ele toca bateria desde criança, toca muito e foi um cara que entrou para ser da banda, não apenas um sub. Ele entrou procurando entender a proposta e se encaixou perfeitamente em todos os aspectos, dando ideias, junto nos perrengues, organizando coisas, criando, não teria como ser melhor nossa relação, a gente se deu muito bem e acho que os dois últimos álbuns com ele refletem essa unidade, que era uma das coisas que a gente precisava real. Acho que desde que ele entrou a banda evoluiu bastante, deu um salto de qualidade. Legal que ele toca em umas bandas bem diferentes entre si, uma de prog (Jack The Joker) e outra de metal (Neverheals) que são muito boas.
HBN – O Vicente, além de ter entrado destruindo tudo, também assinou a produção, junto com a Vanessa Almeida. Foi o primeiro trabalho dele produzindo um disco? Se não me engano, foi o primeiro produzido por alguém da própria banda, é isso mesmo?
Na realidade ele trabalha com isso. Ele tem um estúdio (VTM Estúdio) e grava coisas para o mundo todo no estúdio, grava, mixa, mastreia. Eu acho que foi o primeiro disco de grindcore que ele mixou e masterizou. A gente ajudou nas conversas que tínhamos sobre discos, dizendo como que deveria ser o nosso e dando contraexemplos (“Sabe esse jeito aí? Não é para ser assim“) e eu acho que ele captou perfeitamente. E como ele é batera, acho que ficou ainda mais fácil de entender como deveria ser, pois muitas bandas pecam muito nesse aspecto. Tanto no split quanto no “Truculence” (2025), ele gravou as baterias antes de todo mundo, até das guitarras, a partir dos ensaios que a gente gravava e depois foram gravadas as cordas no VOID (que é o Estúdio do ArielVoid) junto da Vanessa. Eles são nerds de guitarra e de equipamento e passaram um tempão para achar o som que a gente queria. Danyel disse que a Vanessa pedia para ele gravar várias e várias vezes até achar que estava bom o suficiente. Ele disse que quando não aguentava mais e estava morrendo de raiva, a coisa saía…perfeito! (risos).
HBN – A Black Hole Productions acabou de relançar em CD o “Indigesto” (2006), debut da banda. O relançamento traz 11 faixas bônus, sendo 10 da primeira demo (2024) mais “Náusea Perene”, gravada, mas que não saiu na época. Como que foram essas conversas para o relançamento?
O “Indigesto” tinha sido lançado em 2006 e depois em digipack pela Pecúlio Discos, com a demo de bônus. Daí esse ano, eu, o Mozine da Läjä Records e o Camacho (Black Hole Productions) estávamos conversando sobre o lançamento do “Truculence” e que alguns CDs estavam ficando fora de catálogo (como o “Nenhum Puto De Atitude” e “O Joio”) e como já tinha sido lançado a edição de dez anos do “Nadir” (2012), eles decidiram lançar todos eles. Daí seria o primeiro disco da banda lançado e o último. Na verdade, “Náusea Perene” era uma música esquecida que tínhamos ensaiado para sair na demo, mas nunca foi gravada em estúdio, somente em ensaio…e é desse jeito que está nessa edição.
HBN – Você tocou uma campanha bem legal e importante para manter o site Metal Brasileiro Zines (https://www.metalbrasileirozines.com.br) com sua vasta base de fanzines nacionais no ar. A campanha não atingiu 100% da meta, mas chegou bem perto disso. Explica para o pessoal o que é o site e qual sua importância para o nosso underground.
É um dos melhores projetos que já vi alguém fazendo pelo underground, é uma forma de manter a memória dele viva e de como as pessoas o fazem se manter vivo durante os anos, é o puro DIY (“Do It Yourself” ou “Faça Você Mesmo”). O próprio MBZ é DIY e feito por um monte de gente legal, de pegar os fanzines que são feitos no Brasil, alguns que só foram feitos por xerox e colagens, e digitalizar, tratar, ajeitar e colocar no site de maneira gratuita para as pessoas conhecerem aquele material que se perderia facilmente. Eu já entrei com o bonde andando, mas quando me chamaram para ajudar, aceitei na hora. Nesses tempos em que tudo é somente digital, IA, é importantíssimo ter um MBZ para mostrar que existia informação correndo por pessoas que queriam fazer aquilo da melhor forma e de como alguns foram evoluindo para se tornar revista ou alguns somente de death metal, alguns somente alternativos…é um trampo vasto e interminável. Ainda bem. Se você tiver algum fanzine na sua casa, entra em contato com metalbrasileirozines@gmail.com Só não vale se for white, nem nazi.
HBN – Disco novo, batera novo, relançamento do “Indigesto” (2006). O que podemos esperar do Facada para os próximos meses?
O batera já tá ficando é velho na banda (risos). A gente agora quer tocar e tocar para divulgar esse disco, esses relançamentos e espalhar a palavra do “Truculence” por aí. Acho que próximo ano vai sair um 7” da demo, o novo em vinil, mas agora é tocar.
HBN – James, muito obrigado pela participação. Deixa uma mensagem aí pro pessoal.
Valeu, Mário…nós que agradecemos! Comprem material das bandas que você gosta, não façam nem consumam arte com IA, se cuidem, ouçam “Truculence”.
Resenha de “Truculence” (2025): https://www.headbangersnews.com.br/resenhas/truculence-facada/