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Ratos de Porão, Black Pantera e Punhal celebram a vitória da democracia em show memorável no Rio de Janeiro

Ratos de Porão, Black Pantera e Punhal celebram a vitória da democracia em show memorável no Rio de Janeiro

23 de janeiro de 2023


Daniela Barros/Headbangers News

O primeiro show do ano na cidade maravilhosa foi uma linda ode ao antifascismo. E nada melhor do que a banda que melhor representa essa corrente ideológica, o Ratos de Porão, nos brindou com uma noite mágica no último sábado (21). O lugar escolhido não poderia ser outro, o Circo Voador, tradicional casa muito bem localizada, na Lapa, ponto de fácil acesso para quem vem de qualquer lugar do Rio e das cidades no seu entorno, recebeu um ótimo público, quase todos contra a extrema-direita, que foi vencida nas urnas, mas ainda não foi erradicada da nossa sociedade.

A expectativa era grande, pois além do Ratos, o Black Pantera também faria a noite dos roqueiros que não se identificam com essa onda bolsonarista ficar ainda mais agradável. Enquanto as bandas não subiam ao palco, a badalada DJ Cammy Marino ficou responsável pela música, que foi de Megadeth a Dead Kennedys, passando por Carcass, Olho Seco, Bad Religion e Rage Against The Machine. Parabéns duas vezes para a moça. Primeiro pelo belo trabalho e segundo por ela ter aparecido recentemente no documentário sobre Ronnie James Dio.

Com vinte minutos de atraso, às 22h, o Punhal subiu ao palco para iniciar a noite. Ao anunciar a banda e mandar o recado de que apoiadores de terrorismo e de golpe de Estado não são bem-vindos, o organizador do evento, Luciano Paz precisou colocar um imbecil em seu devido lugar, pois esse, tomado por uma coragem que eu não vi jamais em nenhum bolsominion, começou a gritar sozinho, chamando o dono da festa de otário. Claro que ele recebeu um belo esculacho e vaias da galera.
Mas deixemos o sujeito com seus cinco minutos de fama pra lá, até porque ele foi convidado a se retirar da festa e o quarteto carioca mandou muito bem no seu hardcore, trazendo muito peso, ainda que o som estivesse um tanto quanto estridente. A bandeira social e antifascista da banda é louvável e o público, ainda que pequeno naquele momento, formou algumas rodinhas animadas. Em 40 minutos os caras deram o recado com treze músicas – quase todas com títulos enormes – e mostraram que aprenderam (e bem) a lição mais importante do Rock: fascismo não tem vez no estilo, embora estejamos repleto daqueles que não entenderam. Deixaram excelente impressão.

Galeria de Fotos

Setlist Punhal:
Só Não Vence Quem Não Quer
O Brasil Não Deixa
Liberal Brazuca
Uma Lei Pra Eles Outra Pra Nós
Geração de Endividados
A Guerra de Classes Deve Prevalecer
Guia Teórico Sucinto de Como Conversar com um Fascista
O Supérfluo
O Nosso Lugar é Aonde a Gente Quer Estar
Deus da Bala, Bíblia e Boi
Abriram-se os Porões
Mais um CPF Cancelado
A História dos Homens de Bem

Às 23h20, foi a vez do Black Pantera chegar com tudo, com o público nas mãos e o som absurdamente bom. Com sua sonoridade que em alguns momentos parece o Rage Against The Machine dez mil vezes mais pesado e mais furioso, além de elementos como Punk e Crossover Thrash, eles empolgaram durante sua apresentação que beirou a perfeição. Eles mostraram porque são uma das bandas mais relevantes dessa nova geração. O público respondeu muitíssimo bem, abrindo diversas rodas e com muitas pessoas subindo ao palco para o stage-dive, o que aliás, o vocalista/guitarrista Charles Gama fez em um determinado momento do show. Ele se jogou na multidão com sua guitarra e tocou enquanto fazia crowding surf. Rolou uma versão pesada para a música “A Carne”, de Elza Soares, citação para os Racionais MCs e até mesmo um moshpit formado apenas pelas mulheres presentes no local, um pedido da banda. Em 50 minutos, os caras destilaram muita raiva, tanto em sua música quanto em sua pauta social, democrata e principalmente, racial. Como é bom ver uma banda formada por negros, aqueles que iniciaram esse movimento há mais de 70 anos atrás. Um amigo de outro veículo chegou a comentar comigo que o Ratos de Porão ficaria pequeno depois do show do Black Pantera. Eu não cometeria tal heresia, mas, que o trio de Uberaba arregaçou, não há a menor dúvida.

Galeria de Fotos

Setlist Black Pantera:
intro – Jorge Ben
Legado
Padrão é caralho
Mosha
Godzilla
Taca o foda se/ Sexto dia/Toco camburão/ Navio Negreiro (Medley)
Fogo nos Racistas
A carne
Abre a roda e senta o pé
Delírio coletivo
Revolução é o caos
Boto pra fuder
Final James Brown

Era 00h45 quando as ratazanas adentraram ao palco, destruindo o que ainda restava do Circo Voador. A galera subiu ainda mais no palco, dando mais trabalho aos roadies, além das rodas que abriam incessantemente. O som estava bastante embolado no começo, o que dificultava a identificação das músicas em seu início, coisa que foi corrigida ao longo da apresentação. Em 80 minutos, o Ratos incluiu os clássicos de todos os seus onze álbuns de estúdio, num repertório bem diferente do que eles tocaram no palco Supernova do Rock in Rio, quando eles incluíram músicas mais curtas para poder tocar mais no curto espaço de tempo que tiveram. Era a primeira vez que a banda tocava em terras cariocas as músicas de seu álbum mais recente, o excelente “Necropolítica”, que faz uma homenagem às avessas ao pior presidente da história deste Brasil, aquele que está fugido nos Estados Unidos e morrendo de medo de voltar preso.
Nos raros intervalos, João Gordo direcionou xingamentos ao ex-presidente e falou sobre se sentir bem mesmo com sua saúde fragilizada. Ele disse também que pela primeira vez se apresentava sem usar bengala. Teve até mesmo um ocorrido engraçado, por parte do guitarrista Jão, que esqueceu de mudar a afinação da sua guitarra para a música “Beber Até Morrer”. Ele afinou seu instrumento e a música foi iniciada novamente. Eles são humanos e como qualquer um de nós podem errar, estão perdoados e compensam com seu posicionamento antifascista. Há quem critique a banda, dizendo que eles fazem palanque eleitoral. Para estes, só digo uma coisa: são uns ignorantes. Quem não se posiciona, automaticamente fica do lado do opressor.
E a noite proporcionada pelo Ratos de Porão, Black Pantera e Punhal foi simplesmente histórica. São dessas bandas que precisamos para manter viva a pauta principal do Rock que é a subversão. São desnecessários os “artistas” que se identificam com alcunhas risiveis como “alfa” ou “redpill”. O público saiu de alma lavada e a democracia pode se orgulhar de uma parcela dos fãs de Rock que não compactuam com racismo, sexismo, homofobia, misoginia e que também se preocupam com as causas sociais e humanitárias. Parabéns ao organizador Luciano Paz, um cara de pele negra, um batalhador e merece todo o reconhecimento que tem recebido na cena carioca. Como bem afirmou recentemente o guitarrista Jão: “fascista a gente não segue, a gente persegue”. O Rock ainda tem salvação.

 

Galeria de Fotos

Setlist Ratos de Porão:
Alerta Antifascista
Farsa Nacionalista
Amazônia Nunca Mais
Aglomeração
Crocodila
Suposicollor
Necropolítica
Crucificados Pelo Sistema
Descanse em Paz
VCDMSJA
Morte ao Rei
Guerrear
Políticos em Nome do Povo
Caos
Realidades da Guerra
Difícil de Entender
Engrenagem
Toma Trouxa
Expresso da Escravidão
Beber até Morrer
Crise Geral
Conflito Violento
Aids, Pop, Repressão
Paranóia Nuclear
Igreja Universal

Encore:
Sofrer
Herança
Obrigando a obedecer

 

* Crédito das fotos: Daniela Barros/Headbangers News

Circo Voador

Data: 21/01/23

Horário: 21h

R. dos Arcos, s/n - Centro