Há 23 anos, em 2 de agosto de 2002, era lançado mundialmente o álbum de estreia do Shaman. “Ritual” já havia saído no Japão em 21 de junho daquele mesmo ano, e ainda que a própria banda tenha optado por comemorar naquela data, nós optamos em celebrar o disco neste segundo dia de agosto, em que os demais países tiveram acesso a essa obra prima, que é tema do nosso Memory Remains deste sábado.
Antes de falarmos deste disco em si, precisamos voltar um pouco no tempo, mais precisamente cinco anos antes: em 1997, logo após o término da turnê do álbum “Holy Land“, Andre Matos já não sentia o desejo de continuar no Angra. Chegou a sair da banda, mas foi convencido a retornar, gravando o álbum “Fireworks“, que fez aniversário recentemente e nós falamos dele. Mas o caldo entornou quando o baterista Luis Mariutti e o baterista Ricardo Confessori ficariam insatisfeitos com os rumos que o empresário do Angra estava dando à banda e os três resolveram pular fora para montar um novo projeto. Recrutaram o guitarrista Hugo, irmão de Luis e o Shaman estava formado.
O nome da banda, é uma referência a uma das faixas do álbum “Holy Land“, “The Shaman“. O quarteto iniciou o processo de composição e lançaram uma demo em 2001, contendo 4 músicas, das quais, 3 estariam presentes no aniversariante de hoje: “Time Will Come“, “For Tomorrow” e “Blind Spell“, além de uma faixa chamada “Be Free“.
Entretanto, antes de todos iniciarem os trabalhos de composição do aniversariante do dia, Andre Matos se dedicou a um projeto pouco divulgado, onde trabalhou com seu amigo Sascha Paeth. Tendo o Queen como principal referência musical, a dupla viaja por inúmeras influências musicais neste que é considerado por muitos fãs do saudoso maestro como a maior obra de sua carreira.
“Ritual” é um álbum conceitual que trata de diversas culturas indígenas, sobretudo o xamanismo e musicalmente traz alguma semelhança com o que o próprio trio apresentou lá atrás em “Holy Land“, pela mistura de ritmos e utilização de instrumentos incomuns para uma banda de Heavy Metal. Aliás, esse era o diferencial destes caras, pois não tinham apenas a intenção de fazer algo que já era produzido no velho mundo e sim mesclar os ritmos fazendo com que todos ficassem boquiabertos com a capacidade que nós brasileiros temos em dar a nossa cara ao Metal. Isso é impressionante.
O álbum foi quase que inteiramente gravado na Alemanha, à exceção das partes de percussão, gravadas no Brasil. A produção foi do parceiro de longa data de Matos, o alemão Sascha Paeth, com quem o vocalista tinha gravado o projeto Virgo. Vários convidados participaram das gravações, os mais famosos são o ex-tecladista do Dream Theater, Derek Sherinian, Miro Rosenberg, tecladista alemão com trabalhos no Avantasia, Virgo, Edguy, Kamelot, Angra, Luca Turilli, entre outros, Sacha Paeth e Tobias Sammet. Os dois primeiros gravaram participações em “Over Your Head” e “Ancient Winds“, respectivamente. Já Paeth, gravou o solo de guitarra em “Pride” e violão em “For Tomorrow” e “Fairy Tale“, enquanto Sammet dividiu os vocais com Andre Matos em “Pride“.
O álbum é composto por dez canções, sendo uma instrumental, a já citada “Ancient Winds“, que abre o play. A duração total é de 56 minutos, e os grandes destaques do álbum ficam por conta de músicas como “Here I am“, “Distant Thunder“, “For Tomorrow“, “Time Will Come“, “Over Your Head“, “Pride“, além de “Fairy Tale“, que ficou famosa por fazer parte da trilha sonora da novela “O Beijo do Vampiro“, da TV Globo. Era a primeira vez que uma banda brasileira de Heavy Metal conseguia emplacar uma música em uma telenovela com alto índice de audiência, o que não é pouco.
O tempo de audição passa tão rápido que nem percebemos. “Ritual” mostrava que os caras estavam bem resolvidos e que a mudança de ares só os fez bem, marcando a estreia com o pé direito de mais uma banda no cenário Metal do nosso Brasil. Um senhor disco, com certeza absoluta, o melhor lançado naquele longínquo ano de 2002.
A curiosidade sobre “Fairy Tale” é que essa música foi apresentada aos membros do Angra e eles vetaram. Hoje em dia, os headbangers conservadores (duas palavras que não combinam na mesma frase, mas os brasileiros insistem nisso) iriam cancelar a banda por emplacar uma música no que eles chamam de “globolixo”, alcunha tão ridícula quanto a militância deles por um inelegível, e agora, usuário de tornozeleira eletrônica, que está apoiando o tarifaço que Donald Trump ameaçou ao nosso país.
“Ritual” vendeu mais de 500 mil cópias e proporcionou uma turnê longa que durou quase dois anos, que deu ainda mais visibilidade para a banda. Deixa também um legado sem tamanho para o Heavy Metal tupiniquim e está marcado como um dos mais importantes da história do estilo. Merece toda aclamação possível.
Um álbum que envelhece bem, mas infelizmente a banda acabou mal e terminou da pior forma possível, após o baterista redpill e bolsonarista fanático (soa até como um pleonasmo, já que todo eleitor do dito cujo é fanático, eles foram capazes de doar 17 milhões via Pix para o cidadão como se ele estivesse merecendo/ precisando), que destilou ódio e preconceito nas redes sociais e o último show da banda, na primeira edição do Summer Breeze Brasil, em 2023, embora tenha sido uma épica homenagem à Andre Matos, foi de um improviso que beirou o anti-profissionalismo. Mas nada tira o brilho deste álbum que merece ser celebrado e figura fácil como um dos dez melhores do Heavy Metal brasileiro de todos os tempos.
Ritual – Shaman
Data de lançamento – 02/08/2002
Gravadora – Universal Music
Faixas:
01 – Ancient Winds
02 – Here I am
03 – Distant Thunder
04 – For Tomorrow
05 – Time Will Come
06 – Over Your Head
07 – Fairy Tale
08 – Blind Spell
09 – Ritual
10 – Pride
Formação:
Andre Matos – vocal/ teclado
Luis Mariutti – baixo
Ricardo Confessori – bateria/ percussão
Hugo Mariutti – guitarra
Participações especiais:
Tobias Sammet – vocal em “Pride“
Derek Sherinian – teclado em “Over Your Head“
Fabio Ribeiro – teclado em “Blind Spell“
Axel Naschke – teclados adicionais/ backing vocal
Rannveig Sif Sigurardóttir – vocais femininos em “Ancient Winds” e “Fairy Tale“
George Mouzayek – derbak/ bandolim/ percussão em “Over Your Head“
Ademar Farinha – instrumentos de sopro/ percussão/ violão em “For Tomorrow“
Claudia Lemos – Instrumentos de sopro/ Percussão/ Violão em “For Tomorrow“
Anette Barryman – flautas em “Fairy Tale“
Vanessa Desiderio – gaita de fole em “Time Will Come“
Cristiano Bicudo – gaita de fole em “Time Will Come“
Marcus Viana – violino/ cordas/ Harpa indiana em “Ancient Winds“, “For Tomorrow” e “Over Your Head“
Sascha Paeth – guitarra solo em “Pride”/ violão em “For Tomorrow” e “Fairy Tale